REDENÇÃO
Chico estava na padaria com seu Érico, mas deixou café pronto na térmica. Fui atrás dele arrastando o chinelo. Vi que atendia uma senhora no caixa. Esperei ele contar o troco e ser gentil com a mulher. Ele me olhou com culpa antes de vir me abraçar e dizer de novo que sentia muito.
- Faz favor de me dar parabéns, Chico.
- O que tu vai fazer hoje?
- Quero ir à praia. Vamos? Não dá pra ficar trancado aqui num dia como esse.
- Não tem ninguém pra ficar no caixa. Pode ser mais tarde?
- Sem problema. Me empresta o fusca? Dou umas voltas por aí e mais tarde venho pegar você pra gente nadar. Você vai mesmo, né?
- Vou.
E ainda tirou cinquenta reais do caixa para a gasolina. O que deu no Chico hoje? Estava arrependido pelo tapa na cara, era isso, só podia. Quando vim buscá-lo no fim do dia, não estava mais ansiosa, tinha calor, sede, vontade de nadar e chupar picolé. Ele usava uma bermuda velha e estava suado.
- Passou protetor?
Não tinha quase ninguém na praia. Passava das oito. Estendi a toalha para ele e fiquei de pé olhando o mar. O papel dizia que eu tinha nascido perto da meia-noite, então ainda havia tempo.
- Deita aqui comigo.
- Tô ouvindo direito?
- Deixa de besteira, menina. O sol tá se pondo. Deita aqui pra ver.
Eu não queria mais, mas deitei. Chico pegou minha mão e segurou forte. Nos olhamos, olhamos o sol fraco ir descendo no horizonte até se esconder atrás das nuvens. Voltamos a nos encarar.
- Eu quero ser bom pra ti, te proteger. Mas você me assusta com essas ideias malucas.
- Não são malucas, você é que não me entende. Se não fosse essa situação você ia me querer?
- Isso não tem nada a ver.
- Tem, sim. E você não tem coragem de admitir que me quer como eu te quero. Você iria embora comigo prum lugar onde ninguém conhecesse a gente? Eu iria.
- Tá vendo como você é?
- É como eu vejo as coisas, só isso. Quero que você me ame, Chico.
- Eu não posso... não do jeito que tu quer.
- Como você sabe?
- Tu é minha irmã, porra!
- Eu não tô falando só de sexo.
Ele calou. Se achava que eu iria pular sobre sua barriga e implorar estava enganado. Eu me sentia quieta e pensativa. Meus sentimentos por ele continuavam ali, em algum canto de mim, mas aquilo era tão doído e precioso que depois de ontem eu preferia não tocá-lo mais. Que ficasse tudo como estava, eu deitada ao lado de um homem lindo e desejado, mas inalcançável. E inseguro. Já não tinha esperança, só desejava, ainda desejava, o peito fervia, as mãos formigavam, a boca tremia, eu silenciava diante de todas as possibilidades que se desfaziam, como as ondas que batiam na praia a alguns metros de nós.
Eu era a louca, a perdida da família, e não me importava. Fugiria, deixaria tudo para trás se ele estivesse disposto a arriscar. Se. Chico segurava minha mão, só isso. Nunca passaria disso.
- Vou pra água.
- Quer que eu vá?
- Você que sabe.
Tirei a roupa sem olhá-lo e caminhei até a água sem saber se me seguiria. As ondas que me lambiam as pernas foram aos poucos me cobrindo e de repente me vi desaparecendo para ele. Mergulhei nas sombras, fui o mais fundo que consegui e aproveitei esse momento para não pensar, não ser nada, não estar em busca de coisa alguma. Ali me movimentava livremente, abrindo e fechando os braços, as pernas e impulsionando o corpo para a frente sem dificuldade, com toda aquela água ao redor. O mar me possuía, ia e vinha por todas as fendas do meu corpo, me lavava de qualquer pecado que estivesse desejosa de cometer. Estava tão distraída pelas ondulações do mar que não senti Chico se aproximando. Ele era outro, o outro que me queria. Esse estranho que o dominava me puxou debaixo d’água para que eu o percebesse e me envolveu com mãos escorregadias que deslizavam querendo me conhecer de todas as formas, me seguravam e soltavam. Nadei para longe, ele me seguiu e me segurou pela cintura, mas escapei com a ajuda da água. Chico, ou aquele que tomava conta dele, veio e me tomou nos braços. Seus olhos brilhavam de desejo, era só o que eu conseguia vislumbrar na escuridão. E era de uma intensidade que me feria e eu me debati até ele me acalmar com um beijo. Parei de lutar quando os lábios que me chamavam de irmã tentaram roubar o sal da minha pele. Jamais conseguiriam por completo, mas eu deixei que tentasse. Era meu presente de aniversário.
6 comentários:
Acordei hoje inquieto, porque não tinha lido o capitulo de "ontem" AHAHA'
Perfeita, como sempre, Nina!
ALLINE, ME DEIXASTE COM FALTA DE AR QUERENDO SABER MAIS DESSA HISTÓRIA!
COMO É Q TU FAZES ALGO TÃO INEXPLICAVELMENTE ENVOLVENTE E ENCANTADOR ASSIM HEIN?
SÓ PODIA SER VC MESMA!
QDO PUBLICAR COMPRO UM EXEMPLAR E VOU ATRÁS DE TI P AUTOGRAFARES P MIM!
FELIZ NATAIS E ÓTIMOS ANOS NOVOS!
BJOS
FIQUE C DEUS.
RITA DE CÁSSIA
Ual! Que tentação! rsrs
Tô implicada com essa história... Aguardando anciosamente pelo próximo capitulo!
Ótimo texto Alline, como sempre com aquele clima de sedução e perigo que adoro!
Beijos, ótima semana!
Eder:
E olha que quase não saiu! Foi uma parte inédita, criada na última hora. Tava supercansada e de saco cheio, tinha trabalhado até tarde. Mas não quis quebrar o clima da quinta. Ainda bem que valeu a pena. ;)
Beeeeijo
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Rita:
Quem sabe um dia eu consigo publicar e mudo a história de novo? Ia ser muito divertido, isso sim! =DD
Teu comentário é mais um estímulo pra mim. Brigada!
Beijo+beijo+abraço
E que ano que vem você tenha muitas ideias iluminadas
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Nanda:
Perigo não vai faltar, viu? Acho que sedução também. Ansiosa fico eu, aguardando o retorno de quem tem acompanhado a história. Dá um friozinho na barriga toda vez que publico...
Beeeeijos, ótima semana pra ti também!
Esse post eu já tinha lido mas ainda não tinha comentado...Preciso dizer que fiquei inquieta na cadeira e com um calor digno das saunas do inferno?
Não, né?
Pois.
Sem mais para o momento.
Ui, ui...rs
ℓυηα
Luna:
Não precisa, não. Foi o mais inesperado de todos, sabias? Não tava com grandes expectativas nesse banho de mar. Humm, mas acho que valeu, hein?
Todos banhados... eitaaaaa! rsrs
Beijobeijo!
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